Flávia Ventura

Depoimento
Natural de Belo Horizonte, 1991. Vive e trabalha em São Paulo, SP.
A partir de uma pesquisa que se aprofunda sobre o orgasmo feminino, investiga o deslocamento de discursos e protagonismos em relação ao corpo, gênero, violência e sexo. Bacharela em Artes Plásticas com habilitação em pintura pela Escola Guignard (UEMG), propõe um tensionamento entre o desenho e a pintura, em diálogo com a performance, instalação e fotografia.
Realizou as exposições individuais (segredo) [Galeria Lume, São Paulo, 2022]; Água Viva [GAL Arte e Pesquisa, Belo Horizonte, 2022] e Tramas da Resistência [Aliança Francesa, Belo Horizonte – 2018] e participou das exposições coletivas: 18º Salão Ubatuba de Artes Visuais [Ubatuba, 2022]; Questões de Fronteiras (curadoria Renato de Cara) [Edifício Vera, SP, 2022]; Mulher no Plural [ALMG, BH, 2022]; Temporada de Verão [GAL, BH, 2022]; Rua de Despejo, [Kasa Invisível, BH, 2022]; Mostra Museu, arte pública, mídias diversas e virtual [curadoria Ana Carolina Ralston – São Paulo, SP – 2021]; Mulher no Plural: Múltiplas perspectivas [ALMG, Belo Horizonte (virtual), MG – 2021]; Vestígios, SESC [curadoria Lívia Lopes, Palmas, TO – 2021]; Ode ao Natal [Casa J Galeria, curadoria Camila Lacerda e Will, 2021]; Inverno Estelar [Espaço Comum Luiz Estrela, Belo Horizonte, MG – 2020]; Entre o isolamento e o contato [Escola Guignard, Belo Horizonte (virtual) – 2020]; Ações de Apartamento [Espaço Bananal, Belo Horizonte, MG – 2019]; XIX Mostra Interna [Escola Guignard, Belo Horizonte, MG – 2019]; Desenho em Distensão [Escola de Belas Artes, Belo Horizonte, MG – 2019]; Arte na Luta [Aliança Francesa, Belo Horizonte, MG – 2018]; Mostras Coletivas Itinerantes [Espaço Cultural Padre Eustáquio, Belo Horizonte, MG – 2018]; Proteja Seus Amigxs [Galeria quartoamado (curadoria Efe Godoy e Maria Sílvia), Belo Horizonte, MG – 2018] dentre outras.
Recebeu os prêmios: Funarte RespirArte, Artes Integradas, Nacional, virtual (2020) e FORPROEX Sudeste – Fotografia (1o lugar) (2019) e obteve menção honrosa no Festival Durante de Performance (curadoria Paulo Nazareth, Camila Buzelin e Shima), Belo Horizonte, virtual (2021)
Participou das residências: Residência Artística Circuito de Festivais, Belo Horizonte, virtual (2021); Arrudas Pesquisa em Artes, JA.CA Center e Galeria Periscópio, Belo Horizonte, MG (2022) e Residência Vera #2, São Paulo, SP (2022).
Água Viva
NO DIA EM QUE CHOVI, O CÉU DESABOU BRILHANDO
Telas que se contorcem e ocupam chão e parede no espaço como marcas de corpos fantasmas. “No dia em que chovi, o céu desabou brilhando” de Flávia Ventura é o prenúncio da pós-tempestade, do alívio, do conhecimento dos limites do corpo.
Por associação livre e pela construção dos panejamentos, estes trabalhos me remeteram à escultura “O Êxtase da Santa Teresa”, considerada a escultura mais escandalosa de Bernini. Corpos que caem e se projetam. O êxtase em grego: “sair para fora de si”. Um estado psíquico, um gozo. Inútil procurar um sentido para estas definições nos dicionários.
O squirting que envolve os trabalhos de Flávia Ventura nos dá esta dimensão de coisas vivas e pulsando. A construção pictórica tem uma fatura fluida, um domínio de tradições da pintura envolvendo construção de afetos e figuras. Estes acontecimentos que também envolvem desenhos, instalações e performances. A pintura neste contexto assume outra materialidade. Acrílica e látex sobre tela, acrílica e pastel oleoso sobre tela demonstram variadas camadas cor de carne. Ou melhor, vários tons de pele que se misturam, se rejeitam e se completam.
Clarice Lispector descreve em Água Viva: Neste instante-já estou envolvida por um vagueante desejo difuso de maravilhamento e milhares de reflexos do sol na água que corre da bica na relva de um jardim todo maduro de perfumes, jardim e sombras que invento já e agora e que são o meio concreto de falar neste meu instante de vida. Meu estado é o de jardim com água correndo. Descrevendo-o tento misturar palavras para que o tempo se faça. O que te digo deve ser lido rapidamente como quando se olha.
O estado de água correndo nas pinturas de Flávia Ventura nos traz a materialidade da onda, da chuva e do mar. E podemos parafrasear as palavras da frase de Clarice: O que te mostro deve ser visto rapidamente como quando se fala.
Os títulos de seus trabalhos também nos dizem desta amplitude do corpo. “A pequena morte”, expressão que, em francês (la petite mort), diz do período refratário após o orgasmo. Desaparecimento, escuridão, imersão: George Bataille – “o erotismo é a aprovação da vida até na morte”. Assim, em suas pinturas as camadas de tintas, superposições, instante-já, morrem e se ocultam para construir outras superfícies. Renovam sua existência e biografia.
Sebastião Miguel
Belo Horizonte, início do outono de 2022
Professor de pintura na Escola Guignard-UEMG. Doutor em arte contemporânea pelo Colégio das Artes da Universidade de Coimbra.