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Pinturas Anacrônicas

Exposição "Pinturas Anacrônicas" de Sebastião Miguel tem início neste sábado (4)

 

Obras expostas em quatro núcleos no espaço Mama/Cadela provocam o público a refletir sobre a permanência dos arquétipos humanos

 

O espaço Mama/Cadela apresenta a exposição "Pinturas Anacrônicas" do artista Sebastião Miguel. A mostra é um mergulho na intersecção entre o antigo e o contemporâneo, trazendo à vida temas mitológicos e religiosos de maneira inesperada. A abertura será realizada neste sábado (4/5), das 17h às 21h.

 

A exposição estará em exibição até 26 de maio de 2024. Durante este período, os visitantes são bem-vindos às sextas, sábados e domingos, das 9h às 16h, enquanto durante a semana as visitas são mediante agendamento prévio pelo direct do Instagram @mama_cadela.

 

Sebastião Miguel em suas obras desafia a linearidade do tempo, mesclando discussões do inconsciente com imagens atemporais. Narrativas complexas, convidando o espectador a refletir sobre a permanência dos arquétipos humanos ao longo da história.

 

A curadoria e expografia estão a cargo de Rafael Perpétuo, que trabalhou meticulosamente para dividir a exposição em quatro núcleos/salas distintas. Estas abarcam referências à História da Arte, explorações da psique humana, temas religiosos e uma perspectiva (não) explicitamente erótica, todas interligadas pela visão singular de Sebastião Miguel.

 

As pinturas de Miguel são uma reflexão sobre a tragédia da morte e uma celebração da vida. Elas desafiam convenções, oferecendo um olhar provocativo sobre nossa relação com o passado e o presente, ao mesmo tempo em que exploram a sensualidade humana de forma sutil e provocante.

 

Sobre o artista

Sebastião Miguel nasceu em Nepomuceno (MG), em 1958. É artista visual, participa de exposições desde a década de 1980, com individuais no Brasil e coletivas em instituições de relevância no Brasil e Exterior. É bacharel em artes plásticas pela Universidade do Estado de Minas Gerais, especialista em arte e contemporaneidade pela Escola Guignard-UEMG, e mestre em arte e tecnologia da imagem pela Universidade Federal de Minas Gerais e doutor em arte contemporânea pelo Colégio das Artes, Universidade de Coimbra, Portugal. Foi vice-diretor da Escola Guignard-UEMG. Professor de pintura na Escola Guignard-UEMG. Sua obra, com ênfase em pintura e desenho, discute o próprio processo da pintura, artes gráficas, exposição experimental de artes visuais, literatura, cinema e novas mídias. Investiga a relação entre representação e subjetividade.

 

Serviço

Exposição "Pinturas Anacrônicas" - Sebastião Miguel

Data: 4 a 26 de maio de 2024

Horário: 17h às 21h no dia 4 de maio e nos demais dias nas sextas, sábados e domingos, das 9h às 16h. Durante a semana as visitas são mediante agendamento pelo direct do Instagram @mama_cadela.

Local: Mama/Cadela, Rua Pouso Alegre 2048, Santa Tereza, Belo Horizonte, MG

Entrada gratuita

 

Contato para imprensa: Larissa Domingues|

Telefone: (31) 98644-8746

E-mail: larissa.c.domingues@hotmail.com

Sebastião Miguel | Telefone: 31-992044018   sebastiao.miguel@gmail.com

Curador Rafael Perpétuo 31-984326464 

 

Pasta de imagens

https://www.dropbox.com/scl/fo/nfezgtbjjrdex6oxb8abk/h?rlkey=rfit674ez7n7i9j8a9mlmg7bz&dl=0

 

ANTES QUE EU MORRA

Em nosso último encontro, em cada cômodo que passávamos, você repetia "preciso fazer essa exposição antes que eu morra". Sordidamente, como criança levada e com um sorriso discreto, esperava o espanto do interlocutor. Uma picardia, ainda que quase ingênua, dizia muito de como é seu olhar para o mundo externo: um misto de questões simbólicas e seus caminhos entre contrastes e contradições.

Estranho a fala e questiono Sebastião Miguel sobre o nome da exposição: "Pinturas Anacrônicas". Responde que as obras são de tempos distintos e não dialogam entre si no tempo atual, mas que fazem sentido em seu desejo de expor o conjunto. "Anacronismo" (do grego ἀνά "contra" e χρόνος "tempo") diz de algo que situa seu nascimento em outro tempo histórico e é lido de forma distinta de seu momento primordial. São como ruínas, aquilo que já foi lugar, hoje é a beleza da memória de outrora que nossa sociedade glorifica como se a própria ruína acabara de nascer e esta se valesse dos predicados de seu estado natural e posterior, em forma de elegia.

Dividimos a exposição em quatro núcleos/salas: as de referência à História da Arte, as que se relacionam a seu interesse pela psique humana, as de cunho religioso, e as (não) explicitamente eróticas. Os parêntesis se dão pois entendo que todas são eróticas em algum nível. Até o retrato de Joseph Beuys, um dos ícones da arte conceitual e fundador do grupo Fluxus. Além deste, há estranhos desconhecidos, santos conhecidos, escritos em grego, flores das mais diversas adornando rostos vazios, cores intensas, narrativas históricas. Sendo anacrônico – afinal o anacronismo é um jogo de vai e vem -, diria que se Miguel nascesse séculos antes, poderia ser correligionário de Nicolas Poussin, ter pintado a Igreja de Santa Sofia de Istambul ou um discípulo de Paul Klee.

Seus temas transitam entre o sagrado das religiões abraâmicas e o erotismo dos corpos masculinos, que muitas vezes lembram os homens de Giotto (1267-1337), com seus rostos pávidos, mortificados, as partes se valendo de poucas expressões. Temas estes escanteados na arte contemporânea – inclusive considerado cafona, termo que o artista assume com gosto -, ainda que, principalmente agora com a onda reacionária dos últimos anos, o erotismo e o sexo tenham voltado a ser tabu. Alguns permeiam a androginia, outros se valem de faces brutamente esculpidas. Mas são essencialmente homens que transitam no espectro de suas fantasias mais íntimas. Se Miguel, estudioso de psicanálise, apresenta esses fantasiosos caracteres, está antes de mais nada refletindo sobre si mesmo e o gozo das tragédias. Constrói imagens eróticas sem cenas de sexo ou órgãos à mostra. Claro que ele as pinta, mas aqui selecionamos somente retratos, pois estes estão completamente embebidos na sensualidade de suas personagens: amantes, atores pornôs, santos, ícones. Tudo se atravessa.

Miguel faz uso de imagens fotográficas como referência para a produção de suas pinturas. Isso o coloca em uma genealogia que conecta diretamente com a tradição da arte que sempre se valeu da tecnologia para construção técnica de imagens, seja a utilização da camara obscura por Caravaggio, passando por Édouard Manet, Paul Cézanne, os Dadaístas, Francis Bacon, Gerard Richter ou Wesley Duke Lee. Ama Pasolini. Ama Mishima. Ama Bataille. Miguel atravessa esse laço comum para se conectar com a imagem pela afetividade. Se as imagens técnicas têm o sentido da permanência ou "congelamento" da representação, o artista produz sentido ao utilizar a fotografia como mecanismo de seu carinho e fantasia pelas imagens de seus desejosos afetos. As pessoas que se foram, as pessoas que são parte do amor carnal, as pessoas que são parte de suas fantasias fruto das imagens em movimento.

Miguel deseja a tragédia da morte passolinista, mas por enquanto, ainda que a morte seja o fundamento da vida, ficará por este plano, para aí sim, o nosso sabor.

Rafael Perpétuo. Artista visual, foi curador e diretor do Museu Mineiro e  do MAP - Museu de Arte da Pampulha. Doutorando e Mestre em Artes Visuais na UFMG, é pós-graduado em Gestão Cultural pelo Itaú Cultural e, graduou-se em Artes Plásticas pela Escola Guignard. Foi coordenador de exposições na Superintendência de Museus de Minas, professor no Arena da Cultura/BH. Recebeu o Prêmio Escultura no 10° Salão Nacional de Arte Contemporânea de Guarulhos 2010, além do Prêmio ArtePraia Natal/RN 2014 e o Prêmio Rede Nacional da FUNARTE 2013 com o GRUPO INDIGESTÃO. Dentre suas principais exposições destacam-se a individual “Orientações” no Palácio das Artes (2008) e as coletivas “Ocupação Cisco, Lasca” na Galeria Dotart (BH); FLAC (Feira Livre de Arte Contemporânea, 2017), Projeto Multiplo – Centro Cultural São Paulo; “Abre Alas”, Galeria A Gentil Carioca, Bienal do Recôncavo Baiano; “Vs.” – Galeria de Arte da Copasa; “Jogos de Guerra”- Memorial da América Latina e Caixa Cultural/RJ curadoria de Daniela Name; “O Peso do Branco” – EEP Guarulhos, curadoria Efrain Almeida; “Novíssimos” – Galeria de Arte do IBEU; “Urban Jealousy”, Bienal de Terrã-Irã; “draw_drawning_2” – Bienal de Londres curadoria Giacomo Picca. Realizou residências pelo CEIA na FUNARTE(BH), NUVEM media lab (Mauá/RJ), SESC Palladium (BH) e Projeto Pedregulho (RJ).

 

 

Sebastião Miguel, artista

 

“Grande é a vida...é real e mística...seja aonde for e o que for” (Walt Whitman)

 

Há algo de obscuro _ e de misturado_ no fato de a vida ter sido iniciada, a vida, por exemplo, peixes, sangue, pão, vinho. E no fato de a vida ter um fim: o fim do peixe em nossa boca, por exemplo, o sangue fugindo de nossos corpos, por exemplo, o pão cuja matéria-prima se esgota, o vinho que evapora. Ou não: o fim do peixe em nosso fim, na terra onde nasce o trigo para o pão e a uva para o vinho, a mancha no fundo do copo.

Não conhecendo suficientemente nenhuma ciência e nenhuma religião, nem mesmo a vida, confuso acontecimento com o qual ambas lidam a seu modo, nem mesmo elas satisfeitas de uma vez por todas com suas versões do que ainda não era história e talvez não venha a ser, prefiro as pinturas de Sebastião Miguel, onde deus e desejo se compõem.

Dele, tenho, afortunada, em casa, “O Antônio”, que, considerado uma divindade, é, na pintura e no título dela, um homem. Assim “O João e o Jesus”, “O Jacó” e, inversamente, “Castañeda”, “Beuys”, “O irmão”, que, homens, têm aura. Nessas e em outras pinturas de Sebastião Miguel, figura e fundo também se embaralham: tudo é figura. E as tintas, aplicadas umas sobre as outras nem a tempo de se estancarem, sugerem o gesto de mais de uma mão, o ir-e-vir de um mesmo Sebastião ou de muitos, múltiplas e indecisas histórias, múltiplos e inconclusos (sempre) sonhos, transportes para mundos que não conseguimos definir além deste ou neste mesmo, indefinível e que principia, para cada um de nós, do que há de desejante, nu, num homem.

Amar o desejo humano como a um representante do divino e vice-versa, dar a isso matéria, luz, aparição não mais instantânea, óleo derramado sobre o tecido esticado na madeira, deixar que o apalpemos ou que, somente olhando, lembremo-nos de como é tocá-lo, de como é tocar, sem definir, sem crer: para mim, em minha ignorância de outros mistérios, é isso que o Miguel, duplo substantivo Sebastião, artista, faz.  Tomai e comei.

 

Alícia Duarte Penna, poeta, nasceu em Belo Horizonte, em 1962. Em 1984, publicou "Duo terno e gravata" (edição independente); em 2012, "Quarenta poemas e dez" (Scriptum) e, em 2023, "origem-destino" (Impressões de Minas). É autora de obras em colaboração com outros artistas, entre as quais "Pétala Petulância", peça musical composta por Eduardo Guimarães Álvares, e "Espelho Diário", a videoinstalação e o livro (EDUFMG/EdUSP/IOSP), com Rosângela Rennó.

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